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CASO MARI FERRER: A ABSOLVIÇÃO QUE NOS REVOLTA

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Ontem foi um dia horrível. Não só o pior presidente vetou um projeto de lei que distribuiria absorventes a mulheres pobres (falarei mais disso semana que vem), como o acusado de estuprar Mari Ferrer foi absolvido em segunda instância.

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Por 3 votos a 0, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) manteve a sentença aprovada em setembro do ano passado. O que pesou foi o exame toxicológico, realizado quatro meses depois do estupro (em dezembro de 2018), que não comprovou nenhuma droga ou bebida alcoólica no sistema da vítima (o que contraria depoimentos, inclusive do próprio acusado, de que ela estava “bebaça”). 

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Após a primeira audiência, a advogada e coordenadora do Me Too Brasil classificou a absolvição como “um deboche” . E afirmou: “Se você é um empresário, branco, rico, com poder de influência, ainda que existam inúmeros elementos probatórios, o Judiciário e o Ministério Público vão conseguir proteger o seu caso. Temos aquela fala do juiz, ‘Melhor absolver cem culpados do que condenar um inocente’, e eu nunca vi um juiz falando isso para uma decisão que fosse de uma pessoa negra”. 

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Ontem mais advogadas se manifestaram. Andrea Costa, especialista em direito penal e palestrante sobre combate à violência contra a mulher, explicou que a absolvição “nos traz um grave abalo na luta em defesa das mulheres, principalmente nos crimes de ordem sexual”. Num crime tão comum em que há muita subnotificação (só uma minoria das pessoas estupradas denuncia o crime, e o caso Mari Ferrer nos ajuda a entender o porquê), esta sentença fará com que ainda mais vítimas se calem. É um presentão de bandeja pros estupradores. 

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Até porque o que o promotor Thiago Carriço de Oliveira apresentou para absolver o acusado no ano pasado (que ele não sabia que Mari estava dopada, logo, não é estupro de vulnerável) abre jurisprudência para muitos outros casos de estupro. Poderiam homenagear o promotor e chamar essa nova aberração jurídica de “defesa Carriço”. O próprio promotor deu como exemplo na primeira instância: se um homem transa com uma menina de 14 sem saber que ela é menor, não é estupro de vulnerável! 

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Para Mariana Nery, advogada especializada em direito da mulher, a alegação de estupro sem intenção (crime por erro de tipo) é um “absurdo jurídico [que] pode ser igualado à tese da legítima defesa da honra. Ambas se baseiam na ideia de que a sexualidade da mulher é irresistível aos homens”. Segundo ela, todo o caso comprova “a cultura do estupro e naturalização da violência institucional que nós, mulheres, sofremos no Judiciário, seja como parte, como vítima ou como advogada”. 
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Segundo a defesa de Mari , os desembargadores entenderam que a prova da vulnerabilidade é dúbia (por causa do exame toxicológico), mas que ela e o acusado de fato fizeram sexo. Apenas — olhem o absurdo e como isso abre oportunidades formidáveis para outros julgamentos de estupro — “que não era possível cravar que ele sabia que a modelo não estava em condições de consentir com o ato”. Entenderam? Daqui pra frente, nem será necessário pra um estuprador invocar o velho e batido “transamos, mas foi consentido”. Basta dizer “transamos, mas eu não sabia se ela podia consentir ou não”.

 

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E nem isso. Apesar das provas — havia sêmen do acusado na calcinha da vítima, foi comprovada conjunção carnal e rompimento do hímen –, o acusado, na sua terceira ou quarta versão (primeiro ele disse que não teve nada com Mari, depois que transou, mas foi consensual, e por último que ela fez sexo oral nele), apelou para uma narrativa que não se sustenta. 


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Em reportagem do ano passado: “Em novo depoimento, Aranha mudou sua versão dos fatos e confirmou ter tido contato com a jovem, porém alegou não se lembrar completamente do que aconteceu. Disse apenas que ela o seduziu, que o contato entre os dois se deu de maneira breve e que ela teria praticado nele sexo oral”. Sexo oral em homem rompe hímen da mulher?!


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Há pelo menos duas coisas para se considerar sobre o crime de estupro. Uma delas é que só porque um acusado é absolvido do estupro não quer dizer que o estupro não ocorreu, e muito menos que a vítima mentiu. Sete em cada dez homicídios não são punidos no Brasil. Isso não quer dizer que o homicídio não ocorreu, certo? Quer dizer que, de alguma forma, ou o assassinato não foi bem investigado, ou não foram coletadas provas suficientes para condenar o acusado. Com estupro, a impunidade é muito, muito maior


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Outra coisa é que estupro é um crime em que, muitas vezes, não há provas. É só a palavra da vítima contra a do acusado. Mas no caso Mari Ferrer, há provas. Muitas. Por isso é ainda mais chocante que, num caso de enorme repercussão que vai muito além da palavra da vítima contra a do acusado, o tribunal absolva o réu por “falta de provas”. É um tapa na cara de todas as mulheres brasileiras. Felizmente, a defesa de Mari já avisou que entrar com recurso no STF. 

Esta derrota doeu em mim como se tivesse sido eu a vítima. E, pelo que vi no Twitter, muitas mulheres se sentiram assim. Vários homens também. Apesar do investimento pesado em difamar a vítima, não conseguem manipular a opinião pública. Tirando os misóginos de sempre que invariavelmente condenam a mulher, são poucos os que não consideraram a sentença ultrajante. Força, Mari! Você não está sozinha!

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Ontem aquela bela música (e coreografia) de protesto que as chilenas inventaram em 2019 não saiu da minha cabeça. E eu chorei:

O patriarcado é um juiz

Q nos julga por nascer

O ESTADO OPRESSOR É UM MACHO ESTUPRADOR. 

O post “CASO MARI FERRER: A ABSOLVIÇÃO QUE NOS REVOLTA” foi publicado em 8th October 2021 e pode ser visto originalmente na fonte Escreva Lola Escreva

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