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REPORTAGEM ESPECIAL:  Lixo atômico de Itu

De tempos em tempos, ele “explode”

Esta carta, escrita em língua brasileira, e gravada em vídeo-tape, vai durar no máximo 15 anos, no entanto, o que ela pretende denunciar, precisa sobreviver muitos séculos. É que em Itu (…), estão enterradas duas mil e quinhentas  toneladas de uma pasta radioativa chamada Torta II que contém 20 toneladas de urânio. Todo este material, potencialmente tão perigoso para a saúde humana, foi enterrado há apenas 300 metros de um córrego que serve de água potável a uma cidade (…) Itu!”

Com estas palavras, o jornalista Fernando Gabeira inicia uma reportagem sobre o lixo atômico de Itu, em 1985.

Cinco anos antes o tema já havia sido pauta na grande mídia: Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo e Jornal Nacional, da TV Globo, falavam sobre o material radioativo na cidade.

“Começou uma pressão de grandes empresas aqui da cidade, como Gandini, Elma Chips, Schincariol, pois as pessoas estavam associando produtos da cidade a produtos contaminados”, conta Lázaro Piunti, que era prefeito de Itu nesta época.  

Grandes manifestações aconteceram no próprio local da estocagem e também no Centro da cidade. Os ituanos não queriam aquele “hóspede indesejado”.

“Na mesma época eu criei o Condema (Conselho de Defesa do Meio Ambiente) Eu nomeei, então, Beatriz Cristofoletti como presidente, e nosso objetivo era tirar o lixo do município”, recorda Piunti.

“Em 1986, pedimos audiência com o presidente José Sarney, e o lixo iria para a Serra do Cachimbo ou então ele seria jogado no mar – na época este protocolo era comum. Eu estive na Alemanha e cheguei a visitar resíduos similares que eram guardados em vagões de trem”, conta Piunti.

Segundo o ex-prefeito, todo o movimento político, econômico e a opinião pública estavam ganhando forças e o lixo estava próximo de ser retirado.  “Estávamos quase conseguindo, e, então, explode o Césio.”

O acidente com Césio-137 aconteceu em Goiânia, capital de Goiás, em 13 de setembro de 1987: catadores de materiais recicláveis descobriram uma máquina de radiologia abandonada e retiraram uma peça do equipamento. O desmonte fez com que 19 gramas de Césio-137 fossem expostos. No total, foram monitoradas 112.800 pessoas, das quais 249 apresentaram significativa contaminação .

Acabava ali o desejo e a coragem de mexer com o material enterrado na zona rural, temendo consequências similares. Em 1995, o Ministério Público de Itu arquiva um processo por “falta de prova de danos causado pelo depósito”.

200 mil cruzeiros

Era manhã de 19 de novembro de 1974.  Em plena  ditadura militar, uma reunião da Comissão Nacional da Energia Nuclear selou o acordo da compra de um terreno em Itu, no bairro Botuxim, no valor de 200  mil cruzeiros, “para depósito de resíduos contendo urânio e tório e que até o presente se encontram depositados em terreno situado em Santo Amaro”.

Naquela época, havia previsão de beneficiamento posterior do material, com o objetivo de recuperar o urânio e tório nela contidos.

“Interessava que fosse nesta região o depósito pela proximidade com Iperó, em que a Fazenda Ipanema começava a fazer o submarino atômico”, conta Piunti.

A Nuclemon, subsidiária, empresa estatal, ligada ao Ministério de Minas e Energia, comprou o sítio e, sem informar formalmente a nenhuma autoridade local, começou a transferir resíduos de Santo Amaro para Itu.

O caso veio à tona em julho de 1979, quando Olavo Volpato governava a cidade. “Uma professora, Isabel Cristina Spinardi Moz, viu que tinha algo estranho em um sítio próximo a escola em que lecionava, no bairro Botuxim. Ela comunicou ao vereador Amaury Cristofoletti, que foi até o local e constatou que estavam depositando Torta II no local”, recorda o ex-prefeito Lázaro Piunti.

Após isso, houve melhorias no armazenamento do material, que até então estava estocado com várias irregularidades.

Jornal de época

TCU

Quase 50 anos depois, o “lixo atômico” continua em Itu. Após a polêmica dos anos 80,  o assunto foi retomado apenas em 2013, quando o então deputado  federal e atualmente vereador de São Paulo, morador de Itu, José Olímpio, protocolou na Câmara dos Deputados, em Brasília, uma solicitação ao Tribunal de Contas da União (TCU) auditoria contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial nas despesas da Indústria Nucleares do Brasil (INB) com os depósitos de armazenamento.

Em 7 de novembro daquele ano, ele realizou uma audiência pública em Itu. Deputados federais, membros da Comissão de Minas e Energia da Câmara Federal,  estiveram presentes no encontro e cobraram dos responsáveis uma maior fiscalização. O evento chamou a intenção da imprensa local e regional, que esteve no local do depósito.

Questionamos o político sobre qual foi o resultado da auditoria do TCU. Sua assessoria afirmou que “na época, ele entregou tudo para o então prefeito Antonio Luiz Carlos Gomes (Tuize), e nunca mais teve um retorno”.

Novamente, o tema caiu no esquecimento e voltou à tona apenas em 2021, com a possibilidade do material similar ao abrigado em Itu, atualmente em Interlagos, São Paulo, também vir para a cidade. Segundo a assessoria da INB, o lixo até hoje não foi continua na capital.

Iniciamos nesta quarta-feira, 9, uma série especial sobre este tema. Acompanhe mais detalhes sobre esta pauta nos próximos dias.

Esta reportagem tem o apoio da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), do Meta Journalism Project e do Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ).

(Texto: Rosana Bueno Fotos: Reprodução jornais/ Diana Galvão/ Júlio André Piunti)

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Fonte

Publicado em November 9, 2022.
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